Poema inédito
lamber a dor obscura
que adormece sob a nossa consciência incerta
há tanto por fazer e tanto por viver
aí onde estás tão longe do que nos queres
não faltam sonhos impossíveis
e luzes semiacesas
lamber a dor obscura
que adormece sob a nossa consciência incerta
há tanto por fazer e tanto por viver
aí onde estás tão longe do que nos queres
não faltam sonhos impossíveis
e luzes semiacesas
il sogno di un’empatia impossibile
discorso illeggibile come la tua volontà
lo sproloquio usurato del poeta vecchio e tonto
sai come comunicare il mio dolore
come se fosse tuo di diritto e
intanto
la vita termina qui
dove cominci a pronunciarti
nesse olhar que foge de toda a alteridade
há talvez um certo prazer em arrebanhar a nostalgia e o amor
impugnando e rabunhando a toda a força a exceção intrínseca
o sonho de uma empatia impossível
discurso ilegível como a tua vontade
o paleio roto do poeta velho e tonto
sabes como comunicar a minha dor
como se fosse tua por direito e
no entanto
a vida termina aqui
onde começas a pronunciar-te
À memória de
Sophia de Mello Breyner Andresen,
que completaria hoje 95 anos
Nos dias que correm, ler é considerado uma traição, um ato tão inútil quanto desrespeitador da ordem pública e dos bons costumes. Ler é um ultraje que ofende os mais elevados e nobres preceitos morais, que estipulam que há uma hora certa para começar a trabalhar, que há uma hora certa para acordar, que há uma hora certa para atender às imperiosas necessidades fisiológicas da nossa fraqueza humana, que há uma hora certa para comer, para beber, para urinar e defecar, e todas essas coisas que têm por força de ser feitas, que há uma hora certa para falar – e muitas mais horas certas para ficar calado –, uma hora certa para lavar os pratos ou varrer o chão, uma hora certa para sacudir tapetes e fazer a cama e lavar a roupa, uma hora certa para trazer à luz os filhos que hão de ser da pátria e do mundo mais do que nossos, uma hora certa para ouvir, uma hora certa para assistir a programas medíocres de televisão ou ao tédio bem disfarçado de um qualquer jogo de futebol, uma hora certa para acatar e aceitar e suportar e assimilar, uma hora certa para pagar, uma hora certa para dormir até à hora certa de acordar outra vez para repetir todas as laborações ditadas pela rotina diária das pessoas de bons costumes e de decência comprovada.
Ler mais…Veio parar-me às mãos, estes dias, um exemplar do livro “Sob o Amor” de Antônio Mariano, poeta brasileiro com quem me cruzei virtualmente, há uns anos, num daqueles felizes acasos da vida. Ao autor, agradeço o presente que, como veremos, muito me agradou. Aos leitores, sobretudo àqueles que não gostam de perder um bom livro de poesia, tentarei aguçar o apetite com alguns apontamentos breves da minha leitura.
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